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Tereza Cristina

sábado, 19 de julho de 2008

Acompanhamento familiar de crianças hospitalizadas


ACOMPANHAMENTO FAMILIAR DE CRIANÇAS HOSPITALIZADAS. REFLEXÕES SOBRE AS IMPLICAÇÕES SOCIAIS DECORRENTES.

Atualmente, é inquestionável a importância do acompanhamento familiar de crianças e adolescentes hospitalizados. Já foi amplamente abordado pela literatura específica a repercussão favorável da estabilidade emocional e afetiva deste frágil segmento sobre a evolução do tratamento.

O Estatuto da Criança e do adolescente – ECA instituiu em seu artigo 12 tal fundamento. Porém, apesar de ter sido aprovado desde julho de 1990, a implementação pela maioria dos estabelecimentos de atendimento à saúde tem apenas cerca de oito anos. A inércia na aplicação da lei teve, por alguns, a alegação de falta de instalações adequadas para receber os familiares em tempo integral (poltronas apropriadas; refeições, banheiros próprios para banhos...). Entretanto, o preconceito e a dificuldade na absorção dos familiares no processo terapêutico ficou bastante evidenciado enquanto retardo na garantia deste direito.

Na leitura de Brunholi e outros (1998: 301) é enfatizado que a criança enfrenta a experiência da hospitalização com muita intensidade, já que no espaço hospitalar é inevitável a subordinação do corpo ao desconhecido; a vivência de emoções de sofrimento; de terapêuticas dolorosas e até de morte. O acompanhante passa, assim, a representar o elo entre o ambiente hospitalar e o familiar. Participa de alguns procedimentos, dado a sua proximidade afetiva com a criança e constitui-se, muitas vezes, em fonte do diagnóstico médico, considerando-se a limitação da criança para verbalização coerente sobre condicionantes da patologia.

No cotidiano de intervenção do Serviço Social na enfermaria de Pediatria são demandadas, tanto por familiares, quanto por membros da equipe profissional, várias situações envolvendo implicações sobre a condição do acompanhante, o que denota o “avesso do direito”.

Da parte da equipe profissional, destacam-se: dificuldade de compreensão do acompanhante sobre a necessidade de alguns procedimentos médicos e de enfermagem; de adaptação dos mesmos às normas hospitalares; pouco envolvimento no papel de acompanhamento do tratamento; tensão no intercurso entre membros da equipe e o acompanhante; hábitos do acompanhante não compatíveis com o ambiente hospitalar (vestes sumárias; tom de voz alto; falha na higiene...)...

Da parte dos acompanhantes, ressalta-se: tensão pela preocupação com o quadro clínico; informações mais detalhadas e compreensíveis sobre a patologia e evolução do tratamento; sentimento de inferioridade devido hostilidade advinda de algum membro da equipe; limitações para permanecer em horário integral... Sobre a última situação, sublinha-se como principais associações: dificuldade dos pais trabalhadores formais em serem liberados pelo empregador; preocupação com outros filhos em casa, agravada pela falta de apoio na família e na comunidade; necessidade de amamentação de outro filho em casa; gravidez em estágio avançado; trabalho informal imprescindível no sustento da família...

A perspectiva do Serviço Social tem como base a compreensão de que, tanto profissionais quanto acompanhantes, convergem para o anseio de melhor e mais rápida recuperação da saúde da criança. Atua de forma intrínseca à equipe de profissionais e busca contribuir para a interpretação da condição social subjacente ao processo saúde-doença e ao processo de internação hospitalar. Intervindo em abordagens individuais ou nas atividades grupais, busca-se a interpretação da norma, a sensibilização sobre a necessidade da mesma para a qualidade do atendimento e o acolhimento e encaminhamento das insatisfações dos acompanhantes no que lhes for de direito.

Compreende-se que o acompanhante, na maioria das vezes a mãe, vem para enfermaria trazendo, junto com sua criança, a sua ansiedade; seus medos e apreensão. Trazem também sua condição social; sua adolescência; seus hábitos; sua postura diante do poder e da autoridade, a qual pode ser de constrangimento e subordinação, ou de predisposição.

A própria representação que os usuários fazem sobre aquilo que é público, traz o entendimento do descrédito, desvalorização de sua condição de cidadania e de precarização sobre o que é ofertado. Há que se reconhecer que, nem sempre, os profissionais compreendem a dimensão educativa de sua ação, independentemente do segmento ao qual se vincule. É comum serem envolvidos pelo caráter rotineiro e operacional da assistência. Outrossim, muitas vezes subentendem em seu discurso a naturalização e o conformismo pela precarização do que é público e, conseqüentemente, pela subordinação do usuário ao poder institucional. Apesar de não atuarmos no “Penha Dor” temos a obrigação cidadã com a assistência de qualidade, preservando a noção de direito na relação com o usuário.

O processo de acolhimento do acompanhante, bem como de busca de sua adaptação ao processo terapêutico é difícil, porém necessário. Exige a “descontaminação” do olhar e a compreensão interdisciplinar de sua condição e de sua importância. Considerando-se o seu caráter de ligação entre o ambiente hospitalar e o familiar, pode propiciar a compreensão sobre os condicionantes do contexto sócio-familiar sobre o processo saúde doença, e, assim, associar os fatores biológicos com os sócio-culturais, conforme o conceito ampliado de saúde, preconizado pelo SUS,

Referências bibliográficas:

ABRAPIA. Mãe, se eu for para o hospital, você vai estar comigo? Guia de orientação para serviços de saúde e acompanhantes de crianças e adolescentes hospitalizados: um direito da criança, do adolescente e da família. Petrópolis, RJ: Autores & Agentes & Associados, 1997, pp. 26-28.

BRUNHOLI, Gislene do N. e outros. O direito e o avesso do acompanhamento familiar – um estudo sobre os reflexos da hospitalização na criança e na família. Anais do IX CBAS. 1998, pp. 301-302.

GOMES, Verônica de O . O Art. 12 do Estatuto da Criança e Adolescente no cotidiano das enfermarias pediátricas do HUPE. Revista “Superando Desafios”: cadernos do Serviço Social do Hospital Universitário Pedro Ernesto, n. 4, 1996, pp. 55-62.

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